terça-feira, 29 de outubro de 2013

Em 85% das empresas, menos da metade das mulheres volta ao cargo após licença maternidade

Segue na íntegra o artigo do jornal Folha de São Paulo.

Original aqui.

Via Agência Patrícia Galvão

(Folha de S.Paulo) A arquiteta Cintia Costanzi, 40, voltou a ter um emprego em setembro, depois de mais de três anos em que esteve cuidando dos filhos.
A história profissional de como a maternidade de Constanzi alterou a sua vida profissional não é só dela: empresas brasileiras são as que mais veem suas funcionárias irem embora depois do período de licença-maternidade, mostra uma pesquisa da consultoria Robert Half feita em 14 países.
Entre cem diretores de RH ouvidos no Brasil, nenhum disse que a chance de uma profissional voltar ao trabalho depois da licença é alta (maior que 75%). Em 85% das empresas, menos da metade das mulheres volta ao cargo.
Para as empresas, o fato de muitas mães não voltarem é ruim porque "é difícil encontrar pessoas especializadas", afirma Marta Chiavegatti, 31, gerente da Robert Half.
"É importante ter ferramentas de retenção dessas profissionais", diz.
Ela cita a oferta de trabalho em horários flexíveis para que a profissional possa compatibilizar suas diferentes atividades.
Esse índice baixo de volta ao trabalho, se comparado a outros países, não deve ser interpretado como uma escolha da mãe, diz Débora Diniz, professora da UnB (Universidade de Brasília).
Antes, diz, é "um sinal de que algo está errado no suporte público para o retorno ao trabalho". Ela cita falta de creches com horários expandidos e em locais variados.
Diniz diz que, entre mulheres de nível hierárquico mais alto, a volta é maior. A pesquisa verificou isso: entre as que ocupam cargos gerenciais, a chance de voltar é maior do que 50% em 63% das empresas. Isso acontece no mundo inteiro, mas no Brasil especialmente.
SAIR E ENTRAR
Em 2009, Costanzi engravidou de gêmeos. Mas perdeu um dos bebês e o outro necessita de cuidados especiais.
O plano era voltar a trabalhar em seis meses, mas ela decidiu ficar mais tempo perto da criança. E nessa época ela engravidou novamente. "Meu marido precisou cuidar de todas as despesas", diz.
A socióloga Nina Madsen, do CFEMEA (Centro Feminista de Estudos e Assessoria) considera que um dos motivos que explicam a baixa taxa de volta ao cargo depois da licença-maternidade é a divisão do trabalho doméstico, que geralmente fica mais sob responsabilidade da mãe do que do pai.
"Precisaria haver uma campanha pública para que os homens assumissem mais responsabilidades parentais. As mulheres saíram para o mercado, mas os homens não vieram mais para casa", diz.
Ela cita que o fato de a licença-paternidade ser de cinco dias é um sintoma de como criar os filhos é visto, inclusive pela legislação, como atividade só feminina.
Cristiane Lázara, 40, assistente-executiva da fabricante de tratores AGCO, é uma das que saíram do emprego depois da licença, mas no caso dela, foi uma coincidência. Ela trabalhava para uma empresa que foi vendida. Antes mesmo do período para poder ser mãe, ela já sabia que, ao fim do período, seria desligada. Ela aproveitou para ficar mais tempo cuidando da filha e só voltou a ter um emprego neste mês. "Não me arrependo. Esse um ano e meio que fiquei sem trabalhar foi fundamental."
O tempo que ela ficou fora do mercado é o mais comum para as mulheres que saem do emprego após o período de licença (veja quadro ao lado). Mas muitas mães nem mesmo voltam a trabalhar.
Por enquanto, esse é o caso de Tatiana Manski Krongold Benitez, 37, mãe da Isabel. Ela foi demitida pouco depois de voltar da licença e, em 11 meses de procura, já fez dez entrevistas de emprego.
"Já ouvi que não seria contratada porque estava em um momento diferente. Ou seja, já tinha uma filha. É uma visão míope, pois quem tem filho circula entre outras mães, faz contatos."
A consultora em carreira Mariá Giulise diz que as empresas podem ter "resistência com mães de filhos pequenos por considerarem que elas têm problema de mobilidade para viajar, ou para ficar até tarde no trabalho".
Ela recomenda que a profissional saiba, de antemão, se a vaga que ela está pleiteando exige isso e que, antes da seleção, já saiba como resolver essas questões.
Além disso, no período em que a mulher estiver afastada, "precisa se atualizar para não perder o ritmo e o conhecimento".
Foi o que Laura Vieira, 35, deixou de fazer quando virou mãe da Júlia. Ela passou uma parte da gravidez enquanto acompanhava o marido em um MBA nos EUA, mas não aproveitou para fazer nenhum curso. "Não me reciclei profissionalmente."
Ela conta que, quando faz alguma entrevista para uma vaga, os recrutadores perguntam se ela havia feito alguma aula na área dela. E ela só estudou inglês no período de afastamento. Hoje, faz decorações artesanais para festas infantis.

domingo, 27 de outubro de 2013

Blogagem coletiva – Maternidade e carreira profissional: como não conciliar essas duas coisas

Leia a convocação do FemMaterna para a blogagem coletiva. Vamos colaborar, contando nossa histórias ou escrevendo depoimentos?

O título é uma provocação: estamos habituados a ler reportagens e matérias partindo do princípio de que é super tranqüilo conciliar carreira profissional e cuidado com filhos. E nós do FemMaterna já sabemos que essa facilidade não existe (ou existe para poucos): conciliar cuidados com filhos e carreira, na maioria das vezes, não é um mar de rosas, e às vezes, é impossível, sobretudo para as mulheres. Já está na hora de questionarmos: devemos nos adequar a esse sistema social que exige tempo e dedicação extrema ao trabalho remunerado e ao mesmo tempo dedicação intensa aos filhos? Como o sistema pode ajudar mães e pais a ficarem mais próximos de seus filhos sem que isso seja um impedimento para suas realizações profissionais e vice-versa?
Selo dia 25 Blogagem Coletiva
Os blogs a seguir participam desta blogagem coletiva, compartilhando suas experiências e opiniões sobre esse tema tão central na vida das mães (e dos pais também).
LEIA, DIVULGUE E, MAIS IMPORTANTE, COMPARTILHE CONOSCO A SUA EXPERIÊNCIA. A BLOGAGEM NÃO TERMINA HOJE E FICARÁ EM DESTAQUE EM NOSSO BLOG.
Do blog da Kika Doula
Sei que, para muitas mulheres, isso não se trata de escolha, e sim de sobrevivência. Sei também que no nosso país, o governo não nos proporciona a possibilidade de estar em casa, de exercemos plenamente nossa maternidade, de amamentar o tempo que gostaríamos, de exercer com dedicação plena o nosso melhor papel.”
Do blog Eu Mamãe da Gabi D’Andrea
Sei que sou uma privilegiada, direito de escolha é coisa rara por essas bandas, assim como apoio da família, do marido/companheiro/pai da criança, da sociedade. Em meus sonhos mais loucos todos teriam direito de escolher, de decidir de viver plenamente a criação de seus filhos. A vida de todas as famílias poderiam se adaptar à chegada dos filhos da maneira como for melhor… Neste mundo ideal nenhuma  mulher se sentiria culpada por não ser aquela mãe da revista, que é bem sucedida na carreira, cuida da casa, faz lanches saudáveis para os filhos, brinca com eles, está sempre linda e tem uma vida sexual de dar inveja aos cinquenta tons de cinza! A responsabilidade pela criação dos filhos seria compartilhada e não jogada como um fardo em cima de uma única pessoa…
Do blog Lia de Lua
“A conjunção entre maternidade e carreira depende de muito mais do que decisões e empenho pessoais. Ela deve envolver, para além da rede de apoio imediata, a comunidade toda. A situação da mãe que exerce trabalho remunerado deve ser objeto da atenção dos governos, da sensibilidade dos empresários e da solidariedade da sociedade como um todo, que deve se abster dos julgamentos de costume.”
Do blog Quitandinha da Sharon Caleffi
Há algum tempo eu estou juntando feminismo com maternidade e conversando com as mães que eu conheço sobre as dificuldades, as opressões, as barreiras, os enfrentamentos e as crianças delas. E nenhuma é igual à outra não, pelo contrário. Apesar de termos dificuldades parecidas, cada uma tem uma forma de lidar com elas, uma forma de ver o mundo, um jeito diferente de cuidar e educar suas crianças.
Nós mães somos iguais apenas para o mundo lá fora.
O que não muda é o julgamento alheio: esse, tá sempre com a gente.
Do blog da Mariana Vilhena
“Então, com as mulheres da minha família, pra mim sempre foi clara a capacidade da mulher e a liberdade de escolha, até eu escolher algo diferente do que é esperado hoje. Aí eu percebi que não somos tão livres assim. Uma mulher grávida com mal-estar hoje é visto como frescura. Lógico, o mercado de trabalho não aceita baixa na produtividade. Então eu penso em todas as mulheres que não trabalham por escolha, mas por sobrevivência. De todas que gostariam de cuidar da casa e dos filhos, mas realmente não podem. E lamento muito, do fundo do coração. É por essas mulheres que luto. Por todas que assim como a minha mãe, estão perdendo momentos preciosos de seus filhos pra poder por a comida na mesa e estão sendo destratadas o tempo todo, assim como eu sou mal-vista por ter escolhido ser mãe em tempo integral. Mas o movimento feminista dizendo como a mulher tem que agir e viver a sua vida realmente me entristece e não me representa. Sempre somos julgadas, escolhendo trabalhar ou não. Mas hoje quem escolhe ser dona de casa enfrenta preconceito de todos os lados.”
Do blog Balzaca Materna da Dani Brito
“O primeiro sentimento que tive ao receber a notícia da (primeira) gravidez foi: vergonha.
A recebi como uma sentença, como uma fatalidade. “Sua vida acabou”, ouvi de várias pessoas e senti o peso de cada uma dessas letras. Não era tão nova, mas sentenciada estava por ter posto meu futuro promissor em risco.
Naquele momento e no ambiente de trabalho opressor, tudo o que eu conseguia sentir era incômodo e inadequação. Sentia-me desnuda aos olhares dos outros. Minha sexualidade nunca foi tão exposta. Estava grávida e isso indicava uma vida sexualmente ativa. A gravidez veio para mim como um castigo.”
Do blog Para Beatriz da Isabella Kanupp
Quando falamos de ficar mais tempo com os filhos, de maternidade e volta com a carreira/vida profissional, pouco vemos o reflexo da nossa sociedade machista. É triste, porque não temos essa discussão sobre a paternidade, porque a maternidade e a paternidade é vista de formas tão diferentes. O filho nasce, logo o homem volta a trabalhar. Não há questionamentos sobre deixar de trabalhar e ficar em casa, sobre a terceirização dessa criança, a responsabilidade é da mãe! Fim!

quarta-feira, 23 de outubro de 2013

Mães empreendedoras buscam cursos para se profissionalizar

Reproduzimos na íntegra o artigo da BBC, da Mariana Della Barba.

O original está aqui.

O enredo muda, mas a história se repete entre muitas mulheres que estão saindo da licença-maternidade e percebem que será difícil conciliar a carreira e a criação dos filhos.
Uma é demitida e acaba ficando feliz por não ter de deixar o filho o dia inteiro no berçário. Outra decide transformar um dom em negócio. Algumas optam ainda por mudar totalmente de carreira para se adaptarem melhor aos horários e às necessidades das crianças.
Assim, acompanhando a tendência de crescimento do número de mulheres empreendedoras no país, também vêm aumentando no Brasil a quantidade de mulheres que decidem apostar em uma mudança e se transformam em mães empreendedoras.
De acordo com dados do Sebrae, hoje há cerca de 7 milhões de mulheres com seu próprio negócio no país, um número 21,4% maior do que há dez anos. Desse total, 70% têm filhos (ver box abaixo).
Em outros países porém, como nos Estados Unidos, as mães empreendedoras se tornaram uma realidade há mais tempo, e o fenômeno está mais sedimentado.
Tanto que lá foi criado o termo mompreneurs, um neologismo com as palavras mom (mãe) e entrepreneurs(empreendedor). Esse tipo de negócio foi apontado há alguns anos como a grande tendência dentro do empreendedorismo, sendo alavancado pela popularização da internet.
Ao perceberam que empreender pode ser uma alternativa para a nova vida, muitas mães buscam, como segundo passo na empreitada, cursos para tentar transformar a paixão por alguma área em um negócio profissional.

Só amor basta?


"No começo, muitas mães empreendedoras são movidas por sentimentos bem irracionais, como intuição e um envolvimento muito visceral", diz Michelle Prazeres, que dá consultoria e oficinas sobre o tema e comanda o blogEmpreendedorismo Materno.
"Não que isso deva ser deixado de lado, mas também é preciso buscar orientação. Só de amor o negócio não vai se sustentar."
Michelle é, ela própria, uma mãe empreendedora. Consultora de comunicação para empresas, ela decidiu mudar seu foco de atuação depois que seu filho nasceu, há dois anos e meio, quando percebeu que o ritmo de trabalho que tinha não seria compatível com um bebê.
Como não sabia exatamente que caminho seguir, ela então montou o blog para se inspirar - e acabou achando um filão. Além de agregar contatos de mães que têm seu próprio negócio, ela oferece consultoria sob demanda e cursos para mães empreendedoras, como o que acontece em novembro no espaço Mamusca, em São Paulo.
"Dependendo das necessidades do cliente, também indico outras mães que cuidam de áreas mais específicas, como uma que é webdesigner e outra que tem um escritório de contabilidade", diz Michelle, que analisa setores como finanças, marketing e comunicação.

Aulas com o filho a tiracolo

Uma rede de mães colaboradoras também é um dos segredos do Maternarum, um projeto de Curitiba que busca fortalecer o empreendedorismo materno.
O projeto, lançado há 14 meses, oferece cursos a mães que têm o próprio negócio, com temas como microcrédito (com um especialista da Caixa Econômica Federal), marketing e elaboração de planos de negócios, mídias sociais e fotografia de produtos.
"Qualquer um pode participar, mas aqui a gente entende as necessidades das mães", explica Isabella Isolani, uma das integrantes do Maternarum. "Elas podem trazer os filhos, por exemplo. Às vezes um bebê chora e ninguém estranha."
A consultora Michelle Prazeres aponta esse justamente como um dos empecilhos aos cursos de empreendedorismo tradicionais. "Percebo um crescimento no número de mães que querem empreender, mas ao mesmo tempo muitas não têm verba para se especializar. E o dilema às vezes nem é só financeiro, muitas também não têm com quem deixar o filho."
"Fora que cursos tradicionais para empreendedores por vezes assustam essas mães, já que elas estão entrando agora nessa área. E elas querem algo mais pé no chão, com um conteúdo mais prático."

O sucesso sob a ótica materna

Esses cursos específicos para mães também revelam que seus perfis e seus objetivos muitas vezes diferem de uma empreendedora sem filhos.
"Uma das principais diferenças diz respeito à ideia de realização e sucesso, que se traduz muitas vezes em qualidade de vida e não apenas em lucro", diz Patricia Travassos, coautora do livro Minha Mãe é um Negócio, que traz histórias reais de mulheres que abriram a própria empresa para ficar mais perto dos filhos.
A maioria delas trabalha mais do que quando era empregada, mas apontam que faz toda a diferença poder ter flexibilidade, poder levar e buscar o filho na escola, poder ficar com ele em casa quando estiver doente, acompalhar a lição de casa, almoçar junto, entre outros exemplos.
Para americana Jennie Wong, autora do livroAsk the Mompreneur: Small Business Advice on Starting and Growing Your Own Company(“Pergunte à Mãe Empreendedora: Conselhos de Pequena Empresa para Iniciar e Ampliar sua Própria Companhia”, em tradução livre), o que mais caracteriza uma mãe empreendedora é que elas podem "determinar o tamanho de seu sonho".
"Para algumas, filhos significam trabalhar menos horas, mas para outras é hora de colocar o pé no acelerador, para deixar uma boa situação financeira para eles e para mostrar como é se dedicar 100% a um projeto", diz Jennie.